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Entender o papel das instituições públicas no cotidiano das constantes agressões das quais a população afro-brasileira é vítima. Essa foi a tônica do Seminário Estado, Racismo e Violências que aconteceu nesta terça-feira, 22 de agosto, no Instituto de Biologia da Universidade de Brasília (UnB). O evento fez parte da programação do Interconexões, realizado pela Fundação Cultural Palmares e pela UnB. A programação, que segue até novembro, lembra dos 29 anos da Palmares, comemorados hoje.

A mesa do evento contou com as participações do presidente da Fundação Cultural Palmares, Erivaldo Oliveira; da decana de Extensão da UnB, Olgamir Amancia Ferreira; da diretora de Desenvolvimento e Integração Regional do Decanato de Extensão da UnB, Iracilda Pimentel Carvalho; do coordenador de Políticas Transversais da Secretaria Nacional da Juventude, Vitor Otoni Damasceno; da secretária de Políticas Afirmativas da Secretaria Especial de Promoção de Políticas da Igualdade Racial (Seppir); da secretária de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão do Ministério da Educação, Ivana Siqueira; da diretora do Departamento de Diversidade da UnB, Suzana Xavier; da coordenadora do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da UnB, Renísia Cristina Garcia Filice; do coordenador de Apoio Acadêmico da Pró-Reitoria da Universidade Federal Fluminense (UFF),Tiago Risso; e da estudante de Ciências Sociais Gabriela da Costa Silva.

Erivaldo Oliveira destacou a necessidade de se pensar o estado brasileiro pela ótica dos menos favorecidos. Na opinião do presidente da Fundação Palmares, um instrumento básico para se alcançar a igualdade racial e social está no conhecimento. Daí, na visão dele, a importância de parcerias com a UnB e com as demais universidades brasileiras. “Toda a estrutura da sociedade brasileira carrega o racismo. Por meio do debate podemos pensar em como mudar esta realidade, não apenas na esfera federal, mas estadual e municipal. Temos que capacitar nosso povo para ocuparmos as posições relevantes deste país”, afirmou Erivaldo. Ele aproveitou para saudar a presença de Carlos Moura, primeiro presidente da Fundação Palmares, que compareceu ao seminário.

Gabriela da Costa Silva, estudante cotista do quarto semestre de Ciências Sociais, emocionou o público com seu depoimento, em que relatou o preconceito sofrido no dia a dia da vida universitária. Ela é uma das fundadoras de um coletivo criado para pensar o negro nas ciências sociais. “A universidade foi construída para ser branca. Poucos professores são afro-brasileiros e não se leem autores negros. Ainda há professores que dividem as turmas entre cotistas e não cotistas, estimulando o preconceito”, lamentou.

Um dos principais temas abordados nas falas dos participantes da mesa se concentrou na discriminação a estudantes cotistas. Conforme os debatedores, esses alunos acabam ofendidos tanto por colegas da universidade como por docentes. A UnB foi pioneira do sistema de cotas e tem implementado ações para coibir o preconceito contra os alunos que ingressam por esse modelo.

Em seguida, houve a palestra do professor de Direito Penal, Processo Penal e Criminologia Evandro Piza sobre Racismo Institucional e Universidade. “Não podemos deixar de lado a questão das cotas na pós-graduação, essencial para qualquer discussão sobre esse sistema”, comentou. Piza também defendeu que as agendas de internacionalização das universidades públicas priorizem o intercâmbio com instituições de ensino latino-americanas e que comprovem que trabalham a diversidade. Na sequência, aconteceram intervenções da professora Renísia Cristina Garcia Filice e do professor Rafael Sânzio.

O professor Júlio Cesar Tavares, do Departamento de Antropologia da Universidade Federal Fluminense, apresentou a segunda palestra do dia, falando sobre Vidas Negras Importam: do que Valem Mentes Negras?”. Júlio Cesar criticou o modelo neoliberal de governo, que reduz a contribuição do estado ao bem-estar social e investe na segurança, que, na visão dele, tem a população negra como alvo. Citou como exemplo decisões judiciais que tratam de forma desigual brancos e negros, além do genocídio de jovens afro-brasileiros. Apesar do cenário violento, o palestrante elogiou expressões artísticas que trazem uma percepção crítica para a juventude, como o hip hop.

O professor doutor Clébio Correia de Araújo, vice-reitor da Universidade Estadual de Alagoas (Uneal), falou sobre História, Violência e Identidade Negra. O acadêmico lembrou das condições de desigualdades em seu estado de origem, onde há pouca distribuição de renda e enorme violência contra o povo negro. “Temos talvez o patrimônio mais importante do Mercosul, a Serra da Barriga, no entanto a elite branca torna a contribuição negra invisível, que poderia ser revertida para um projeto de desenvolvimento que beneficiasse toda a sociedade alagoana”, criticou Clébio.

A última palestra do evento foi A Persistência da Raça nas Interações Sociais, proferida pelo professor Valter da Mata, da União Metropolitana de Educação e Cultura (Unime), do município de Lauro de Freitas, na Bahia.